Reforma da Previdência: Alterações na vida de milhões de Brasileiros

Segundo o governo, as reformas são cruciais para uma melhor redistribuição de renda e para evitar que os rombos no atual sistema sejam cobertos com os tributos arrecadados de toda a população, como é feito atualmente. Em 2002, a arrecadação tributária do setor público usou R$ 56 bilhões para suprir esses rombos.
As maiores mudanças ocorrerão no sistema previdenciário do serviço público, já que, segundo o governo, o sistema previdenciário de tal setor está profundamente desequilibrado, em razão das regras inadequadas de acesso a aposentadoria e cálculo de benefícios.
Pelas regras atuais, os servidores estatutários têm como valores de referências para aposentadorias a última remuneração de seu cargo efetivo. Para o atual governo, o grande problema dessa sistemática é que os valores dos benefícios não guardam relação com a vida contributiva do servidor, o que gera o desequilíbrio no atual sistema previdenciário.
O texto de Reforma da Previdência proposto pela Câmara dos Deputados estabelece como regra geral, a utilização dos salários-de-contribuição do servidor tanto do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) quanto nos Regimes Próprios de Previdência dos Servidores (RPPS). As principais propostas foram mantidas, como o uso dos salários-de-contribuição para o cálculo dos benefícios, o redutor para aposentadorias precoces, a diminuição dos supersalários, a contribuição de inativos e pensionistas, o aumento do teto previdenciário para os trabalhadores da iniciativa privada e a possibilidade de criação de sistemas complementares.
O governo defende a contribuição dos inativos porque entende ser esta uma questão de justiça social e de respeito ao caráter contributivo e solidário do sistema previdenciário dos servidores. A Proposta de Emenda Constitucional prevê que vão contribuir os inativos que possuam renda acima de R$ 1.058,00.
Para os servidores que pretendem se aposentar antes que o sistema da previdência mude, essa decisão pode acarretar perda de dinheiro. De acordo com o chefe do Departamento de Direito Social da UFPA, José Cláudio Monteiro, "a vantagem que o governo oferece para quem não se aposentar é não contribuir, mas quem se aposentar terá que retribuir", esclarece. O governo decidiu pagar um abono de permanência para o servidor que tiver cumprido os requisitos para se aposentar, mas decidir continuar na ativa: será de 11%, mesmo percentual que ele pagaria após se aposentar.
O maior impasse entre o governo e os servidores é a forma de contribuição. O governo propõe com a reforma a contribuição definida, serão criados os fundos de pensão, mas os servidores exigem o benefício definido. José Claudio explica: "O governo quer a contribuição definida: o beneficiário contribui com um determinado valor e não sabe o que irá receber de aposentadoria depois de anos de contribuição. Já o benefício definido, a pessoa sabe e programa antecipadamente a quantia que planeja receber na aposentadoria e a recebe conforme acertado. Esta é a forma que os servidores querem. Ninguém vai querer arriscar contribuir sem saber quanto vai receber no final".
A reforma da previdência do governo Lula já foi aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados e sofreu algumas alterações no seu texto original, mas ainda precisa da aprovação do Senado. Os senadores já apresentaram 290 emendas, rejeitadas pelo governo. Os autores das emendas poderão pedir em requerimento, se aprovado o parecer, que suas emendas sejam votadas de forma separada. Caso isso aconteça, e se for grande o número de senadores inconformados com a rejeição de suas emendas, a votação será longa, o que certamente atrasará sua aprovação. Segundo o professor José Cláudio, a votação do Senado é mais complicada do que na Câmara: "Embora tenham menos senadores, eles têm mais possibilidades de mudar certos pontos, pois os senadores não têm atrelamento a lideranças, as quais conseguem aglutinar os deputados a votar em bloco como na câmara. No senado não é tão simples assim", afirma.
José Cláudio ainda diz que as "super aposentadorias" deveriam ter, segundo a reforma, uma redução automática, mas essa redução não será pacífica. "Muitos desses valores absurdos foram obtidos por decisão judicial. Muitas entidades fortes já estão se preparando para ingressar com ações depois que a emenda for aprovada", diz.
Servidores públicos dizem que reforma é injusta


Os servidores públicos são contra a reforma da previdência porque acham que serão os maiores prejudicados. Eles criticam vários pontos da reforma como a taxação dos aposentados, integralidade, paridade e a redução das pensões. "O que está posto nesta reforma é para a retirada de direitos, tipo quebra da integralidade da aposentadoria. Hoje existe a paridade, você é isento do pagamento da taxação dos aposentados, e redução das pensões também não existe. Amanhã, aprovada a PEC 40, a aposentadoria não vai ser integral, será parcial, acaba a paridade, haverá taxação a partir de 1.440, e a questão da pensão também, quem já tiver, estará garantido, mas quem for pedir amanhã ou depois, haverá redução das pensões", argumenta Soares.
Os servidores consideram também que o aumento da idade para aposentadoria seja equivocado. Eles alegam que a expectativa de vida do brasileiro é menor em relação a um país do primeiro mundo, já que além da idade média para se aposentar (55/ mulheres, 60/ homens), terá de se cumprir também os anos de contribuição, (35/ homens, 30/ mulheres). Uma das maiores preocupações está no Projeto de Lei Complementar nº 9, em que será criado um regime de previdência complementar alternativa, que poderá ser feito por entidades fechadas ou abertas. "O sistema que o governo está aplicando hoje de aposentadoria complementar é chamado de contribuição definida, eu sei o quanto eu pago, mas não sei o quanto eu vou receber, isso vai depender da evolução do mercado. Mesmo que tenha um caráter público, ainda há um risco muito grande que o trabalhador receba uma aposentadoria muito aquém do que é o seu salário", explica Ferreira.
Um dos maiores motivos para o déficit na previdência pública é o fato de não se contratarem novos funcionários para substituir aqueles que se aposentam. "No governo FHC, aposentaram-se 750 mil servidores e se contratou apenas 250 mil. Então se não se contrata novos funcionários, terá menos pessoas contribuindo para o nosso sistema de aposentadoria", diz Ferreira. Um outro ponto relevante para o déficit alegado pelo governo é o grande número de pessoas que trabalham informalmente e que não recolhem para a previdência, como explica Aroldo Soares: "São 40 milhões de pessoas que estão na informalidade, e quando o governo diz que há um déficit, ele não considera que não houve geração de emprego".
Enquanto a PEC 40 não é aprovada, muitos professores e funcionários estão adiantando as suas aposentadorias, pois temem perder direitos com a nova previdência. "Está todo mundo correndo, as pessoas vêm ao sindicato para tirar algumas dúvidas, mas elas já sabem que devem pedir a aposentadoria agora, sob pena de perder os direitos que têm e que no futuro serão eliminados. Temos dados fornecidos pelo Ministério de Orçamento e Gestão garantindo que cerca de 100 mil estão em condições de pedir a aposentadoria hoje, e as maiores prejudicadas são as universidades", esclarece Aroldo Soares.
A greve dos servidores públicos terminou no dia 2 de setembro, mas apesar de não ter tido grande eficácia, os representantes dos trabalhadores continuam se mobilizando para conseguir alterar alguns pontos da PEC 40, que será votada no senado. "Agente entende que é uma derrota para o serviço público, a própria perda de direitos desvaloriza o profissional que já está com o seu salário achatado por anos e sem reajuste", afirma Benedito Ferreira.
Adufpa e Sintufpa consideram que a reforma é necessária, mas que ela deve ter um outro caráter, como expõe Aroldo Soares: "A reforma é necessária sim, mas ela teria que vir para combater as distorções, combater a fraude, combater o desvio dos recursos, cobrar os devedores da previdência e não para tirar direitos".
Babá: maior opositor diz o que está errado na reforma

Sobre a reforma da previdência, Babá disse que é a cara mais visível do rompimento da direção que domina o PT com os trabalhadores e a esquerda. Mas ele enfatiza que o problema é muito maior. "O governo de coalizão encabeçado por Lula encampou o programa neoliberal de FHC contra o qual sempre lutamos. Essa política econômica é a serviço do FMI, dos banqueiros, dos latifundiários e da burguesia em geral. Os resultados estão à vista, aumenta o desemprego, o arrocho salarial, a miséria, a violência, enquanto os banqueiros continuam enchendo seus cofres", lamentou o deputado. Ele ainda denuncia que falta muito ainda, dando como exemplos a reforma da CLT, a Lei de Falências e medidas como a autonomia do Banco Central que, segundo Babá, entregam o controle do sistema financeiro nacional aos representantes dos grandes bancos.
Para ele, a reforma da previdência é um exemplo do rumo que ele denuncia, destacando a imposição do FMI, estabelecida na Carta de Intenção que o Ministro da Fazenda, Antônio Palocci, assinou com o fundo. "De um lado, é uma forma de o governo reduzir seu gasto social, para dispor de mais dinheiro para pagar juros da dívida, mas, o mais importante, é que, depois desta reforma, o sistema financeiro vai entrar com tudo para controlar os fundos de pensão. Não é à toa que a previdência é hoje um dos cinco negócios mais lucrativos do planeta. O pretexto de acabar com os privilégios era só uma cortina de fumaça, já que não se necessitava de uma reforma para acabar com os privilegiados e sim uma lei que reduzisse o teto salarial, o que o governo Lula não teve a coragem de fazer e manteve um teto altíssimo de R$ 17 mil, desmascarando os verdadeiros motivos desta reforma", concluiu Babá.
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